Desde pequeno eu sempre sonhei em ser um YouTuber famoso, mas nunca tive uma verdadeira oportunidade de cair de cabeça nisso, pois nunca tive um quarto que possuisse paz e harmonia para eu poder criar vídeos sem eu ser interrompido.
Eu queria ser um streamer programador de sucesso igual ao... hm... Eu não conheço ninguém que programa, que faz streaming e que faz sucesso... Tanto faz! Eu vou ser o primeiro a conquistar essa marca, pois eu sou especial!
Um tal de Ben Awad já falou de todos os problemas sobre fazer live streaming de programação, mas eu vou conseguir superar os problemas, pois novamente, eu sou especial! Aluguei até um escritório para que eu possa ter a paz e harmonia que eu tanto almejava, para que a stream fosse perfeita e eu conseguisse ser popular no mesmo nível de famosos como o SypherPK, Ludwig, Ninja, Pokimane... Ah, mal posso esperar por isso!
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Até que eu experimentei fazer streams de programação, e a realidade é mais enfadonha que a ilusão que eu tinha.
Se você deseja criar conteúdo para a internet, faça um conteúdo que você assistiria. Afinal, se você está criando um conteúdo que você não assistiria, porque outras pessoas assistiriam ele?
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Eu quebrei essa regra.
Eu assisto live streams de pessoas programando? Não, pois eu acho chato ver pessoas programando. Em geral, eu raramente assisto streams, no máximo assisto os VODs do WAN Show e do Atrioc. Então se eu acho chato, outras pessoas também achariam chato, então, porque eu faria live disso?
Claro, tem pessoas que gostam, pois, se ninguém gostasse, não teria uma categoria sobre isso na Twitch. Mas parece que muitas pessoas que assistem programadores são pessoas que começaram a vida de programador e querem assistir programadores experientes para fazerem perguntas sobre programação.
Convenhamos, se realmente fosse algo que interessasse as pessoas, a categoria teria a mesma quantidade de espectadores que de jogos famosos como Fortnite. Infelizmente o sonho de eu conseguir a mesma quantidade de views que o Ninja ou o SypherPK ganham ao jogar Fortnite, mas programando, está muito longe de acontecer.
Ao ter uma ideia, eu desejo implementá-la da melhor forma possível, da forma mais rápida possível, para eu poder aproveitar o meu tempo eficientemente.
Para isso, ter foco ininterrupto no seu projeto é algo imprecindível, para entrar no estado onde a sua alma e o código estão diretamente conectados e focados em solucionar e realizar as suas ambições, o famigerado "Flow State".
O "Flow State" não ativa com um click, e sim como se fosse um streak em games. Se você conseguir manter um streak de X minutos de foco ininterrupto, a sua alma conecta ao seu código e ela é mantida até perder o foco, seja devido a distrações externas ou por cansaço.
Durante uma live stream, você precisa interagir com o chat para manter os espectadores felizes e engajados com o conteúdo, mas ao retirar o seu foco do código e direcionar ao chat, o seu streak é jogado para o quinto dos infernos.
Quando pensei em fazer live streams eu sabia que muitos não iriam entender sobre programação, mas pensei que pelo ou menos os espectadores iriam perguntar sobre assuntos interessantes e cativantes, então mesmo que eu nunca entrasse no "Flow State", pelo ou menos iria rolar assuntos marcantes.
Mas, as perguntas eram as mesmas em todas as streams...
É extremamente cansativo repetir a mesma resposta para essas perguntas rasas pela n-ésima vez.
Você sente que é necessário justificar o que você está fazendo, o que cansa mais ainda. Por exemplo: "O motivo de estar aparecendo com erro no IntelliJ IDEA é porque ele não está detectando corretamente o kotlinx-coroutines
neste módulo, mas o código compila e funciona corretamente!" ou "Eu tive que fazer desta forma os comandos, pois eu queria que eu pudesse colocar novas funcionalidades sem que demore tanto tempo para reiniciar todas as shards, pois no Discord tem rate limiting de login, então... (mais blah blah blah)". Você sabe porque você está fazendo isso, mas você se sente obrigado a justificar para que os espectadores entendam, o que cansa mais ainda.
Para tentar deixar os espectadores entretidos, fiz o meu próprio overlay com integrações com os Pontos de Canal, pois se eu estou ocupado programando coisas monótonas, pelo ou menos os espectadores poderiam se entreter sozinhos, certo?
Na realidade, enquanto o TTS do Falatron e os Sound Effects são engraçados, você perde o foco tentando entender o que o TTS está falando, para ver como você deve reagir.
E se você propositalmente tenta não focar no TTS, seus espectadores começam a ficar bravos, pois você não reage aos TTS que estão enviando, perdendo o propósito do sistema ser algo para os espectadores divertirem os outros espectadores enquanto estou ocupado.
Na verdade você não é chato, mas infelizmente as pessoas que entendem sobre o que você deseja conversar não estão assistindo a sua live.
Eu começo a falar sobre Docker, Kubernetes, coisas avançadas da JVM, problemas de performance... E as pessoas acabam não entendendo sobre o que eu estou falando, aí dá aquela sensação que os espectadores estão "i'm happy for u tho, or sorry that happened".
Você tenta simplificar o que você está falando para que possam entender, mas tem um peso cognitivo maior para realizar a tradução, peso cognitivo que você estava usando para programar, o que volta ao ponto anterior de "Interagir com as pessoas enquanto programa atrapalha a sua concentração".
E infelizmente ser "Criador da Loritta" ou "Criador do SparklyPower" não carrega uma personalidade, pois é apenas um fato sobre mim.
Histórias da sua vida são interessantes de se contar, mas as histórias que pensa serem extremamente fascinantes são chatas e cansativas de se escutar.
Contar histórias é um talento que eu preciso treinar para conseguir transformar até as histórias mais chatas em algo que deixará as pessoas com olhar de "Uau!". Mas, infelizmente, ainda não tenho tal talento.
Durante as minhas lives, eu vazei:
Você pensa "Diagnosis: Skill Issue", mas, na prática, é que se torna algo difícil de você não vazar, pois, basta um misclick ou esquecer que tem secrets abertos em outro app, que vaza.
Em streams de games, você pode configurar para o OBS apenas capturar o jogo, e não o seu desktop inteiro, reduzindo a chance de vazamento para praticamente zero. Exceto se o jogo mostra o seu IP em algum lugar, ou se você tiver um gORDOx Moment™ e falar a sua senha.
Mas em streams de programação? Eu compartilho o IntelliJ IDEA, mas basta o aplicativo que estou programando ter algum log de algo que deveria ser secreto, ou você abrir um arquivo que esqueceu algum secret aberto nele, que vaza algo que não deveria.
Os riscos de vazar algum secret, que pode custar o seu emprego, não valem a pena só para que algumas pessoas possam ver o que você está programando.
E o risco é ainda maior se você decide compartilhar a tela inteira ao invés de apenas do IDE, você quer mostrar o que você está pesquisando no StackOverflow, ou o prompt de comando que você está rodando o app. Nesses casos pode vazar o seu endereço de email dependendo de qual website estava aberto, notificações que possuem informações pessoais, entre outras coisas que seriam melhores que não vazassem.
Não! Eu experimentei fazer streams de outras coisas não relacionadas a programação.
E acabou sendo uma experiência bem melhor e menos estressante do que tentar fazer stream sobre programação.
Mas enquanto jogar é legal, eu quero programar, eu quero desenvolver novas coisas para os meus projetos. O tempo que eu gostaria passar jogando ao vivo não completaria uma schedule boa de streaming comparada com outros streamers populares.
Felizmente o meu trabalho não é ser streamer, e sim criar e manter a Loritta, SparklyPower, e outros projetos meus, então eu não me preocupo em passar semanas sem fazer uma única stream.
E também não significa que eu não irei mais fazer streams sobre programação! Eu ainda farei, pois, tem pessoas que me cobram para estar ao vivo, mesmo que eu precise acabar algum projeto importante rsrs.
Mas talvez eu deveria focar em outros aspectos de programação: Ao invés de ser streams sobre "Fazendo coisa X para a Loritta" ou "Fazendo coisa Y para o SparklyPower", fazer algo parecido com o que o Techno Tim faz nas streams dele, onde ele interage com os fãs respondendo às perguntas deles. O que combina bastante com o canal dele no YouTube, onde o conteúdo dele é sobre administração de sistemas.
E mesmo que eu não fizesse streams, eu ainda faria tentaria fazer vídeos interessantes relacionados com programação. O único problema é superar a preguiça de editar os vídeos.
De qualquer maneira, se gosta da minha personalidade extraordinariamente chata, me siga na Twitch!
Se está pensando em fazer lives sobre programação, ao ler este post você aprendeu quais são os problemas de fazer uma live de programação que é 1:1 do jeito que programaria sozinho. Adapte a sua ideia de live para tentar reduzir os problemas citados acima, para ter uma experiência boa de live streaming!
De qualquer maneira, boa sorte na sua aventura de tentar virar um digital influencer famoso!